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4.8.07

ORÇAMENTO PARTICIPATIVO

Publicado em O NORTE, março/2007

Haroldo Costa Tourinho Filho

Nascido nos anos de chumbo da ditadura militar, no município de Lajes, SC, esse relativamente novo mecanismo de adminstração e planejamento democrático busca, junto à interferência mais dinâmica da população, uma melhor alocação dos recursos públicos. A principal riqueza do OP é a democratização da relação do Estado com a sociedade. Essa experiência rompe com a visão tradicional da política, em que o cidadão encerra a sua participação política no ato de votar, e os governantes eleitos podem fazer o que bem entenderem, por meio de políticas tecnocráticas ou populistas e clientelistas. O cidadão deixa de ser um simples coadjuvante da política tradicional para ser protagonista ativo da gestão pública.
Segundo o professor Chico Oliveira, essa invenção política configura-se como a criação de um novo direito político, enriquecendo o arsenal de instâncias em que as classes e os grupos sociais intervêm ativamente no governo, não apenas na renovação dos mandatos, mas cotidianamente, sem anular outras instâncias. A intervenção se dá, precisamente, na discussão do Orçamento, que é, no Estado Moderno, a peça-chave da política e da administração.Tem-se, pois, o surgimento do OP como um poderoso instrumento para a busca de maior eqüidade e igualdade social, política e econômica.
Adotado por um número ainda pequeno de administrações governamentais, embora algumas de significativa relevância (São Paulo, Porto Alegre, Belo Horizonte, dentre outras), a experiência brasileira, reconhecida mundialmente, extrapola nossas fronteiras, tendo alcançado as capitais do Uruguai e do México, sim, a cidade do México, segunda maior metrópole do mundo.
É sabido, no entanto, que todo o dinâmico e criativo processo do OP passa, necessariamente, pela vontade política do Executivo. No dizer do cientista político Félix Sanchez, "sua efetiva implantação testa profundamente a eficiência, a eficácia e o discurso das administrações que as aplicam." Ainda segundo Sanchez, "há um elemento central que intrinsicamente protege o OP de desvios eleitoreiros e demagógicos."Infere-se daí que, um processo de consulta popular sobre o Orçamento, não sendo efetivamente deliberativo e, sim, marcado por forte intermediação clientelista, pouco consegue realizar em resposta aos compromissos assumidos durante as consultas. Foi o que sucedeu no Recife, nas gestões de Jarbas Vasconcelos e Roberto Magalhães: menos da metade dos compromissos assumidos foram cumpridos. Já em Porto Alegre, 87% das obras e dos serviços indicados pelo OP foram executados. Não iremos analisar aqui a experiência de implantação do OP em nossa cidade, no primeiro governo Tadeu Leite, uma vez que a mesma não passou de engodo, um arremedo de OP.
Em fórum sobre Orçamento Participativo realizado pelo PT local em meados de 2005, tivemos a oportunidade de apresentar duas questões atinentes ao tema. A primeira, inquirindo se o OP em Belo Horizonte, a exemplo de São Paulo, fora instituído por lei; a segunda, sobre a conveniência de se criar uma secretaria municipal voltada especialmente para este fim, como ocorre em alguns municípios brasileiros. Mesmo reconhecendo a vantagem da promulgação de lei regulamentadora do OP - no sentido de obrigar futuras administrações ao seu cumprimento -, advertiu-nos a ilustre e douta palestrante sobre o possível "engessamento" que poderia advir se adotada tal medida, dado à natureza essencialmente dinâmica e criativa do OP. Realmente, a advertência procede, embora haja críticas, e não poucas, a essa posição. No entanto, solução intermediária foi encontrada pela administração que em São Paulo sistematizou o processo. Ali, afastado o inevitável detalhamento requerido pela formalidade de uma lei específica (o que talvez pudesse "engessar" o processo) inseriu-se, na Lei Orgânica em vigência, o artigo 143, que diz explicitamente que o município organizará sua administração com base no planejamento permanente, descentralizado e participativo, como forma de democratizar a gestão da cidade, complementando, ainda, em seu inciso 3º, que é assegurada a participação direta dos cidadãos em todas as fases do planejamento. Entretanto, como já vimos, não basta a lei para incentivar e fundamentar a participação popular e a gestão democrática, pois esta, se será realizada com ou sem participação popular, é uma questão de vontade política do governante.
Quanto à segunda questão por nós levantada quando do citado fórum (a criação de uma secretaria de Orçamento Participativo...), a palestrante viu na iniciativa um como que "isolamento" de tal secretaria, o que poderia vir a comprometer o sucesso da empreitada de implantação do OP. Como na primeira questão por nós suscitada, também aqui há o que se pensar. Em qual setor da administração o OP deve ser desenvolvido? Este pode ser planejado e avaliado no gabinete do prefeito ou vice, na secretaria de Governo, na de Finanças, ouse constitui uma secretaria voltada para essa função específica (elaborar e acompanhar o OP), dizem a respeito os manuais. Assim, como se faz necessária uma instância, um setor da administração voltado para tal mister, parece-nos que a criação de uma simples coordenadoria contornaria o possível problema do "isolamento" aludido anteriormente. Dessa coordenadoria participariam quadros qualificados de todas as secretarias municipais.
MONTES CLAROS
No transcorrer dos entendimentos político-partidários que antecederam à histórica aliança de esquerda - PT, PcdoB, PSB e PPS - que acabaria por eleger o atual prefeito, firmou-se o compromisso de se implantar o OP no município. Questão de honra, basilar, espinha dorsal da campanha política a ser desenvolvida.Naturalmente, em virtude da experiência acumulada em nível nacional, caberia ao PT deslanchar o processo. Pareceu-nos ter sido este o entendimento tácito. Assim, o gabinete do vice-prefeito, petista, coordenaria a iniciativa.
Vieram a eleição e a vitória.Corria o ano de 2005 e nada acontecia... Tempo preciosíssimo, perdido pela administração. Petistas entusiastas e estudiosos do assunto OP (dentre os quais nos incluímos) acorriam ao gabinete do vice-prefeito, cobrando-lhe uma atitude face à inércia que a todos abatia. Nada... Hoje, graças ao farto material que vem sendo divulgado pelo O Norte, em capítulos, sob o título "O Instituto Cultiva e a Prefeitura de Moc" (o instituto foi contratado pela prefeitura para elaborar e desenvolver a "filosofia" da chamada Governança Solidária, na qual se pretende embutir o OP), podemos nos dar conta do que realmente ocorreu naquele ano de 2005 e seguintes.
O e-mail do secretário municipal Vero Franklin, encaminhado ao diretor do referido instituto, Rudá Ricci, e tornado público pelo O Norte, é elucidativo, cristalino. Lê-se ali, em diagnóstico de rara precisão, a gênese do fosso, cada vez maior, entre o núcleo duro do PPS e as demais agremiações político-partidárias a ele coligadas.Tenta-se agora, em que pesem as fundamentadas ponderações do diretor do Instituto Cultiva, a implantação do OP no município. Julgamos que os Conselhos Regionais, CR, deveriam ter sido formados ainda nos primeiros meses de 2005, para, no segundo semestre daquele ano deliberarem, dentro de sua esfera de competência, a inclusão das verbas a eles destinadas e outros assuntos afetos, como o uso do solo, a saúde, a educação, transporte coletivo, asfaltamento de ruas etc.
Como é sabido, o Orçamento é definido em um ano para aplicação no subseqüente, o que nos leva a temer o futuro próximo, tendo em vista a delicada questão da sucessão municipal, cujo processo já foi deflagrado. Pensamos também que, a exemplo de São Paulo, dever-se-ia inserir na Lei Orgância Municipal um artigo que assegurasse a participação popular, via OP, nas decisões do Executivo. Poderia ser redigido assim, simplesmente: Fica garantida a participação da comunidade, a partir as regiões do município, nas etapas de elaboração, definição e acompanhamento da execução das diretrizes orçamentárias e do orçamento anual.
Diante de tal iniciativa, estaríamos todos resguardados e evitar-se-ia o que disse Machado de Assis em "Páginas Recolhidas" (p.105): "... Xerxes ordenou que decapitassem a todos os que tinham construído a ponte e não soubessem fazê-la imperecível..."