Kicker: Partidos sairão a campo para controlar mais de R$ 160 bilhões dos cofres municipais
Marcos Seabra
Gazeta Mercantil
02.06.2008
Vivemos hoje um dos mais impressionantes exercícios de democracia, um verdadeiro exemplo de cidadania. Os quase 30 partidos políticos registrados no Tribunal Superior Eleitoral saíram a campo para buscar alianças e conseguir, nas urnas, a administração de 5.564 prefeituras e outras 59.302 vagas para vereança em disputa por todo o País. Partidos e políticos, imbuídos dos mais elogiáveis sentimentos de solidariedade humana, pretendem colocar sua experiência e ideais administrativos a serviço dos mais de 128 milhões de eleitores. Infelizmente, no primeiro parágrafo deste artigo apenas os números são verdadeiros. Partidos e políticos, com uma sede eleitoreira, "nunca antes vista neste País", saíram a campo atrás das melhores armas para conseguir controlar os mais de R$ 160 bilhões de arrecadação, fartamente depositados nos cofres municipais. Esses recursos, aliás, tendem a aumentar caso se cumpram as previsões do Tesouro Nacional que apontam o crescimento da economia como responsável por um reforço dos caixas municipais de pelo menos R$ 1,645 bilhão via Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O FPM é a parte que cabe a cada município do Imposto de Renda e do IPI recolhido pela União. Para este ano, o Tesouro calcula que os municípios abocanhem, apenas com o FPM, algo em torno de R$ 37,905 bilhões.Vale tudo para controlar esse dinheiro. De cruzamento de jacaré com elefante, até promessas de apoio em futuras eleições. Um show de horrores ideológico. Os projetos de governo sequer estão sendo mencionados. O que conta são os parcos minutos de propaganda eleitoral gratuita, pelo menos naqueles municípios onde existe geração própria de televisão. A principal moeda de troca entre os partidos na composição das alianças eleitorais é a futura participação no governo, caso a aliança saia vitoriosa no dia 5 de outubro. Como de praxe, os prefeitos vão contar com maioria nas respectivas câmaras municipais e conseguirão aprovar qualquer iniciativa, honesta ou desonesta. Os vereadores, por sua vez, terão atendidos os seus pedidos, quase sempre de emprego para parentes e amigos, e farão vistas grossas a estripulias do amigo prefeito. Também como de praxe, a Controladoria Geral da União vai encontrar milhares de irregularidades no uso de recursos públicos federais repassados às prefeituras. Programas e projetos federais e estaduais para atender a população - no papel, soluções perfeitas para resolver os problemas dos mais recônditos grotões - serão desvirtuados. Na prática, um interminável rol de crimes, raramente punidos. Os eleitores vão passar mais alguns anos reclamando ou, simplesmente, ignorando as ações de seus governantes. A oposição/governo fará críticas à incapacidade do governo/oposição em gerir recursos. A Justiça será alvo também de críticas por demorar ou não punir os criminosos. E todos vão sugerir uma reforma política como solução para os problemas. Como que correndo atrás do próprio rabo, parlamentares formalizam a todo instante propostas para solucionar o círculo vicioso em que se transformaram as eleições no País, sejam elas municipais ou não. Porém, o que vemos é a solidificação do processo. A solução para tudo não sairá de uma cartola. Ela virá pelas mãos do eleitor, mas apenas quando ele, povo, não precisar dos favores de um governo municipal, estadual ou federal. Virá quando trabalhar, comer, morar, estudar, além de ter saúde e segurança e não depender da vontade do prefeito, vereador, deputado, senador, governador ou presidente da República. Infelizmente, por enquanto, teremos que conviver com a voracidade da classe política por cargos e recursos e com alianças envolvendo desiguais, a título de "exercício da democracia", e a tolerar um rol de falsas promessas pré-eleitorais na esperança de que se tornem realidade.
Marcos Seabra
Gazeta Mercantil
02.06.2008
Vivemos hoje um dos mais impressionantes exercícios de democracia, um verdadeiro exemplo de cidadania. Os quase 30 partidos políticos registrados no Tribunal Superior Eleitoral saíram a campo para buscar alianças e conseguir, nas urnas, a administração de 5.564 prefeituras e outras 59.302 vagas para vereança em disputa por todo o País. Partidos e políticos, imbuídos dos mais elogiáveis sentimentos de solidariedade humana, pretendem colocar sua experiência e ideais administrativos a serviço dos mais de 128 milhões de eleitores. Infelizmente, no primeiro parágrafo deste artigo apenas os números são verdadeiros. Partidos e políticos, com uma sede eleitoreira, "nunca antes vista neste País", saíram a campo atrás das melhores armas para conseguir controlar os mais de R$ 160 bilhões de arrecadação, fartamente depositados nos cofres municipais. Esses recursos, aliás, tendem a aumentar caso se cumpram as previsões do Tesouro Nacional que apontam o crescimento da economia como responsável por um reforço dos caixas municipais de pelo menos R$ 1,645 bilhão via Fundo de Participação dos Municípios (FPM). O FPM é a parte que cabe a cada município do Imposto de Renda e do IPI recolhido pela União. Para este ano, o Tesouro calcula que os municípios abocanhem, apenas com o FPM, algo em torno de R$ 37,905 bilhões.Vale tudo para controlar esse dinheiro. De cruzamento de jacaré com elefante, até promessas de apoio em futuras eleições. Um show de horrores ideológico. Os projetos de governo sequer estão sendo mencionados. O que conta são os parcos minutos de propaganda eleitoral gratuita, pelo menos naqueles municípios onde existe geração própria de televisão. A principal moeda de troca entre os partidos na composição das alianças eleitorais é a futura participação no governo, caso a aliança saia vitoriosa no dia 5 de outubro. Como de praxe, os prefeitos vão contar com maioria nas respectivas câmaras municipais e conseguirão aprovar qualquer iniciativa, honesta ou desonesta. Os vereadores, por sua vez, terão atendidos os seus pedidos, quase sempre de emprego para parentes e amigos, e farão vistas grossas a estripulias do amigo prefeito. Também como de praxe, a Controladoria Geral da União vai encontrar milhares de irregularidades no uso de recursos públicos federais repassados às prefeituras. Programas e projetos federais e estaduais para atender a população - no papel, soluções perfeitas para resolver os problemas dos mais recônditos grotões - serão desvirtuados. Na prática, um interminável rol de crimes, raramente punidos. Os eleitores vão passar mais alguns anos reclamando ou, simplesmente, ignorando as ações de seus governantes. A oposição/governo fará críticas à incapacidade do governo/oposição em gerir recursos. A Justiça será alvo também de críticas por demorar ou não punir os criminosos. E todos vão sugerir uma reforma política como solução para os problemas. Como que correndo atrás do próprio rabo, parlamentares formalizam a todo instante propostas para solucionar o círculo vicioso em que se transformaram as eleições no País, sejam elas municipais ou não. Porém, o que vemos é a solidificação do processo. A solução para tudo não sairá de uma cartola. Ela virá pelas mãos do eleitor, mas apenas quando ele, povo, não precisar dos favores de um governo municipal, estadual ou federal. Virá quando trabalhar, comer, morar, estudar, além de ter saúde e segurança e não depender da vontade do prefeito, vereador, deputado, senador, governador ou presidente da República. Infelizmente, por enquanto, teremos que conviver com a voracidade da classe política por cargos e recursos e com alianças envolvendo desiguais, a título de "exercício da democracia", e a tolerar um rol de falsas promessas pré-eleitorais na esperança de que se tornem realidade.